A utilização de arcabouços ou scaffolds naturais ou sintéticos para reconstrução, regeneração e reparo de tecidos tem sido uma abordagem com grande potencial terapêutico na medicina regenerativa. Dentre a variedade de scaffolds disponíveis, destacam-se os scaffolds de matriz extracelular descelularizada (dMEC). Basicamente, estes arcabouços biológicos são produzidos a partir da remoção dos componentes celulares de tecidos e órgão, tanto de tecidos humanos ou de outras espécies animais e até vegetais, por meio de métodos químicos, físicos e até enzimáticos, restanto apenas o ‘esqueleto’ de matriz extracelular, o qual é composto por uma série de moléculas bioativas.
A remoção das células é importante para eliminar quase ou completamente a imungenicidade dos biomateriais, uma vez que as moléculas que podem causar rejeição imunológica in vivo estão presentes em sua maioria nas células. Esses arcabouços apresentam diversas aplicações biotecnológicas, desde o carreamento de fármacos até a produção de biotintas para bioimpressão 3D. Além disso, podem ser aplicados diretamente em lesões teciduais e, devido à sua estrutura tridimensional, células podem ser semeadas sobre sua estrutura, permitindo que o material recelularizado seja implantado e estimular o reparo ou regeneração tecidual.
É evidente a importância da matriz extracelular como um microambiente adequado para a modulação dos mais diversos processos celulares . A MEC é uma rede tridimensional de macromoléculas composta por diversas proteínas fundamentais que incluem vários tipos de colágenos, sendo o mais abundante o colágeno do tipo I, o qual é responsável por fornecer resistência e conexão no tecido, além de determinar a disposição dos tipos de células. Outra proteína relevante é a elastina, principal componente das fibras elásticas, as quais conferem elasticidade ao tecido. Além disso, há a presença de diversas glicoproteínas como fibronectina, vitronectinalaminina, responsáveis por mediar a interação entre as membranas celulares e os componentes fibrosos da matriz, atuando em diversos processos que envolvem a comunicação célula-matriz como adesão e migração.Baseado nisso, é de extrema importância que o processo de descelularização preserve as proteínas da MEC e sua ultraestrutura.
Diversos estudos com scaffold descelularizados já foram conduzidos, demonstrando suas diversas aplicações e validações. Por exemplo, pulmões acelulares mostraram-se versáteis para participar de trocas gasosas em alguns estudos, assim como fígados que foram descelularizados e posteriormente recelularizados, mostrando-se capazes de suportar a secreção de albumina e a síntese de uréia. Experimentos com a aplicação de placenta humana descelularizada também se mostraram promissores como biomateriais para tratamento de feridas cutâneas. Além disso, a constante melhoria da tecnologia de descelularização tem tornado cada vez mais promissora a utilização desse tipo de biomaterial.
Observamos a presença dessa linha de pesquisa no Departamento de Cirurgia, mais precisamente no Programa de Pós-Graduação em Anatomia dos Animais Domésticos e Silvestres da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ-USP), onde pesquisadores estabeleceram protocolos de descelularização bem-sucedidos de ovários, tubas uterinas,úteros e placentas de origem suína, comprovando a preservação das proteínas da matriz extracelular, sua conformação ultraestrutural, bem como sua citocompatibilidade utilizando diversos tipos celulares e sua biocompatibilidade em ensaios em animais.
A engenharia de tecidos ainda tem um longo caminho a percorer para desenvolver terapias que permitam a regeneração de grandes segmentos teciduais ou a reconstrução de órgão inteiros, mas grandes avanços tem sido feitos diariamente na área tanto no Brasil quanto no exterior, demonstrando que a utilização de biomateriais derivados tecidos biológicos que são usualmente descartados podem apresentar grande potencial biotecnológico nas áreas da medicinea humana e veterinária.
REFERÊNCIAS:
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