No primeiro blog, exploramos as divisões do sistema nervoso, os diferentes tipos celulares que o compõem e o microambiente mantido pelo líquido cefalorraquidiano. Agora, nesta segunda edição, avançamos para a compreensão do funcionamento neural sob a perspectiva fisiológica. Discutimos o potencial elétrico de membrana, detalhando os fatores que influenciam sua manutenção e como ocorrem as variações necessárias para a geração e propagação do potencial de ação.
POTENCIAL ELÉTRICO DE REPOUSO DA MEMBRANA DOS NEURÔNIOS
Para que o potencial de membrana exista, é essencial haver uma diferença na distribuição de cargas elétricas entre os meios extracelular e intracelular. A bomba de sódio e potássio (Na+/K+ ATPase) desempenha um papel crucial nesse processo ao transportar ativamente três íons de sódio (Na⁺) para fora da célula e dois íons de potássio (K⁺) para o meio intracelular, contra seus respectivos gradientes de concentração. Esse mecanismo resulta em um acúmulo de cargas positivas no meio extracelular, contribuindo para a geração do potencial de membrana.
Além disso, a ação da bomba Na+/K+ mantém uma concentração elevada de K⁺ dentro da célula. Como consequência, esses íons tendem a se mover para o meio extracelular por meio dos canais de escape de K⁺, seguindo seu gradiente de concentração. No entanto, à medida que o K⁺ sai da célula, deixa para trás cargas negativas, geralmente associadas a proteínas intracelulares aniônicas. Esse acúmulo de cargas negativas no citoplasma gera um gradiente elétrico oposto ao gradiente de concentração, criando uma força eletrostática que dificulta a saída contínua de K⁺.
O equilíbrio entre o gradiente de concentração, que impulsiona a saída de K⁺ da célula, e o gradiente elétrico, que o retém no meio intracelular, resulta em um estado de equilíbrio dinâmico. Essa distribuição desigual de cargas gera uma diferença de potencial elétrico conhecida como potencial de equilíbrio do íon K⁺. Como a membrana plasmática em repouso apresenta uma maior quantidade de canais de escape para K⁺ do que para Na⁺, a permeabilidade ao potássio é significativamente superior. Dessa forma, o potencial de equilíbrio do K⁺ exerce maior influência sobre o potencial de membrana em repouso, tornando-o mais próximo do potencial de equilíbrio do próprio íon K⁺ em comparação ao do Na⁺.
A manutenção desse gradiente iônico depende da ação contínua da bomba de Na⁺/K⁺ ATPase, que consome ATP para transportar ativamente Na⁺ para o meio extracelular e K⁺ para o meio intracelular. Esse mecanismo é essencial para sustentar o potencial de membrana em repouso e garantir o funcionamento fisiológico das células nervosas. Devido à alta atividade neuronal e à dependência energética desse sistema, a maior parte do ATP consumido pelo cérebro é direcionado para a bomba. Diferentemente de outras células, os neurônios não armazenam glicose nem oxigênio, tornando seu funcionamento extremamente sensível a qualquer interrupção no suprimento desses elementos. Dessa forma, condições que comprometem a oferta de glicose ou oxigênio ao sistema nervoso podem prejudicar a atividade da bomba de Na⁺/K⁺, levando a disfunções neurológicas severas. Dada a importância dos íons Na⁺ e K⁺ para a homeostase celular e o funcionamento do sistema nervoso, seus níveis séricos são rigorosamente regulados pelo sistema endócrino e pelos rins, garantindo um equilíbrio preciso no organismo.
O POTENCIAL DE AÇÃO NOS NEURÔNIOS
O equilíbrio dinâmico do potencial de membrana em repouso pode ser modificado pela ação de neurotransmissores liberados por um neurônio pré-sináptico. Esses neurotransmissores interagem com receptores específicos na membrana da célula pós-sináptica, promovendo a abertura ou o fechamento de canais iônicos. Essa alteração na distribuição de cargas elétricas na membrana recebe o nome de potencial pós-sináptico (PPS), podendo facilitar ou dificultar a propagação do sinal nervoso baseado na intensidade dos estímulos.
Esse mecanismo pode ocorrer em dois sentidos: tornando a célula pós-sináptica mais negativa ou mais positiva. Quando neurotransmissores ativam receptores que promovem a abertura de canais de sódio (Na⁺), ocorre um influxo de Na⁺ para o meio intracelular, tornando o potencial de membrana mais positivo. Essa condição aumenta a probabilidade de despolarização da membrana e a propagação do impulso nervoso, sendo denominada potencial pós-sináptico excitatório (PPSE).
Por outro lado, se os neurotransmissores ativarem receptores que promovem a abertura de canais de potássio (K⁺), haverá um maior efluxo de K⁺ para o meio extracelular, aproximando o potencial de membrana do potencial de equilíbrio do K⁺. Esse fenômeno torna o meio intracelular ainda mais negativo, dificultando a despolarização e reduzindo a probabilidade de geração de um potencial de ação. Esse tipo de resposta é chamado de potencial pós-sináptico inibitório (PPSI).
Os potenciais pós-sinápticos excitatórios (PPSEs) e inibitórios (PPSIs) são somados ao atingirem o segmento inicial do axônio. Para que um potencial de ação seja desencadeado, é necessário que a soma dos PPSEs supere o efeito dos PPSIs e atinja o potencial limiar, o valor mínimo necessário para a propagação do sinal nervoso.
Uma vez atingido esse limiar, ocorre a despolarização do axônio devido à abertura de canais de sódio (Na⁺) dependentes de voltagem, permitindo um rápido influxo de Na⁺ para o meio intracelular em direção ao seu equilíbrio eletroquímico. Conforme a despolarização avança, esses canais de Na⁺ são espontaneamente inativados e, simultaneamente, os canais de potássio (K⁺) dependentes de voltagem se abrem, promovendo a saída de K⁺ para o meio extracelular. Esse processo interrompe a despolarização e inicia a repolarização da membrana. Durante essa fase, a ação combinada dos canais de escape de K⁺ e dos canais de K⁺ dependentes de voltagem pode levar a uma hiperpolarização temporária, onde o potencial de membrana se torna mais negativo do que o nível de repouso. O retorno ao potencial de repouso ocorre gradualmente à medida que os canais de K⁺ dependentes de voltagem se fecham.
No axônio, esse mecanismo se repete ao longo de sua extensão. O grande influxo de Na⁺ durante a despolarização gera uma difusão passiva desses íons no interior da célula, despolarizando a membrana adjacente e abrindo novos canais de Na⁺ dependentes de voltagem. Esse processo ocorre de forma sequencial ao longo do axônio, da região do cone axonal até os terminais pré-sinápticos, garantindo a condução do potencial de ação. A velocidade de propagação desse impulso nervoso é influenciada pelo diâmetro do axônio e pela presença de bainha de mielina. Nos axônios mielinizados, a condução ocorre de forma saltatória, pois a mielina atua como um isolante, impedindo a dissipação da corrente iônica. O potencial de ação é gerado apenas nos nódulos de Ranvier, que possuem alta densidade de canais de Na⁺ dependentes de voltagem. Esse mecanismo permite que o impulso "salte" de nó em nó, tornando a condução mais rápida e eficiente.
REFERÊNCIA:
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